Pioneiro, movimento sindical bancário atua desde a década de 1990 no sentido de dirimir preconceitos e tornar real a igualdade de oportunidades entre trabalhadores do sistema financeiro
Mulheres, negros, LGBTs, pessoas com deficiência. Qualificados como “minorias”, eles correspondem na realidade a mais da metade da população brasileira. Mas quando o assunto é emprego, remuneração, cargos de chefia, são historicamente relegados à base da pirâmide. E isso não é diferente no setor financeiro. O que faz a diferença, na realidade, é a determinação da categoria bancária em lutar por justiça e respeito à diversidade.
Ciente desse quadro de desigualdade e exclusão, desde 1996 a Confederação Nacional dos Bancários (CNB, hoje Contraf-CUT) buscava incluir o tema igualdade de oportunidades na mesa de negociação com a federação dos bancos. A Fenaban, no entanto, alegava não possuir dados concretos sobre os quais discutir o assunto.
Mais uma vez desafiando o que estava colocado como normal, os bancários postaram-se na vanguarda. E no ano 2000 garantiram, pela primeira vez na história do movimento sindical brasileiro, a inclusão explícita da igualdade de oportunidades na Convenção Coletiva de Trabalho (CCT) da categoria, válida nacionalmente. A cláusula 51ª previa, naquele ano, que a representação dos trabalhadores “apresentaria resultado de pesquisa sobre o tema, abrindo discussão entre as partes”. Não dando crédito ao que até então havia sido tratado como impossível por parte dos bancos, os bancários foram lá e fizeram.
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Assim, em maio de 2001, conduzido pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), nascia o primeiro retrato da categoria: Os Rostos dos Bancários – Mapa de Gênero e Raça do Setor Bancário Brasileiro. “O estudo é uma radiografia precisa e completa da força de trabalho no sistema financeiro brasileiro”, informa sua apresentação. “Representa um fato inédito no Brasil e, por isso mesmo, um momento histórico do sindicalismo no país.”
A partir desse levantamento, os bancários conseguiram demonstrar, com base em dados, o que a rotina já escancarava. “Preconceito e discriminação de raça e de gênero no interior daquele que se considera o mais moderno e dinâmico setor da economia”, informa o estudo, para declarar: “São discriminações inaceitáveis. Eliminá-las será um dos nossos desafios. (…) Raça, gênero, orientação sexual… não devem ser usados como critério para ingresso e ascensão no mercado de trabalho”.
Um mapa e novos caminhos
De lá para cá, à custa de muito debate e muita luta, os bancários estabelecem, ano a ano, uma trajetória exemplar na construção contínua da igualdade de oportunidades. Do Rostos dos Bancários, ao Mapa e depois ao Censo da Diversidade, cada etapa contou com a entrega de trabalhadores, dirigentes sindicais comprometidos com o fim da desigualdade, nos coletivos e na Comissão de Gênero, Raça e Orientação Sexual (Cgros).
A presidenta do Sindicato, Neiva Ribeiro, é um deles. “A partir do Censo pudemos comprovar as desigualdades salariais e de oportunidades para mulheres, negros e negras, pessoas com deficiência (PCDs) e pessoas da comunidade LGBT”, explica. “Essas pesquisas deram embasamento a nossas reivindicações apresentadas aos bancos, com dados da realidade, fornecidos pelos próprios trabalhadores. Com isso, conseguimos avanços sociais na CCT.”
A primeira pesquisa realizada em parceria com a Fenaban resultou no pioneiro censo, ainda chamado de Mapa da Diversidade, em 2008, que comprovou persistirem muitas das disparidades apontadas pelo Rostos dos Bancários.
O tema ganhou força e a categoria passou a contar, em seus calendários de organização, com dias nacionais de luta pela igualdade de oportunidades nos bancos. Um Programa de Valorização da Diversidade foi lançado e os primeiros resultados apresentados pela Fenaban, em 2011, foram considerados insatisfatórios pelos sindicatos.
A luta nunca esmoreceu e a promoção da igualdade continuou dividindo espaço com melhores salários e condições de trabalho como pauta central nas mesas de negociação com os bancos. Em 2012, vem a conquista do novo Censo da Diversidade, o segundo, cujos resultados foram divulgados em 2014. O terceiro Censo saiu em 2019. A soma de todo esse conhecimento ao longo dos anos, informação preciosa, tem servido como base para os debates com os bancos nas mesas de negociação.
Conhecimento é conquista
Neiva lembra, por exemplo, que dos 427.347 empregados de bancos no Brasil, 202.871 são mulheres, ou 47,5% da categoria. Na base do Sindicato são 66.519, ou 47,9% de bancárias em São Paulo, Osasco e região. Na sociedade elas passam de 51,5%. De acordo com apontamentos à consulta feita aos trabalhadores antes da campanha salarial de 2024, para o público feminino a igualdade de oportunidades figura como a mais importante cláusula social da CCT, com 65% das respostas. “São números que demonstram o acerto desse debate iniciado na década de 1990, e a importância do tema da igualdade dentro dos bancos”, avalia a dirigente. Não por acaso, em 2009 a categoria bancária se torna a primeira a ter direito à licença-maternidade ampliada, de 180 dias. E com a preservação da estabilidade, auxílios alimentação e creche durante todo o período.
As respostas ao primeiro Censo, de 2008, revelaram também a dura realidade vivida nos bancos pelo público LGBT. “O formato da pesquisa, a garantia de sigilo, permitiu a esses trabalhadores responderem com segurança e garantiu que pudéssemos levar às negociações com a Fenaban demandas para esses trabalhadores. Assim, nossa pressão e mobilização conquistou, também em 2009, a inclusão de parceiros no plano de saúde e a extensão deste e de todos os direitos para casais do mesmo sexo”, lembra Neiva.
A luta nunca para, e a partir de 2014 mulheres demitidas que engravidam durante o aviso prévio proporcional garantiram o direto de serem readmitidas. Em 2016, uma nova conquista estendeu a licença-paternidade de cinco para 20 dias, para homens que se comprometam com a paternidade responsável, por meio de cursos promovidos por várias entidades e instituições, inclusive pelo Sindicato.
Depois de cobrança nas mesas de negociação com os bancos, os bancários PCDs passaram a ter garantido, em 2024, o direito de se ausentar do trabalho para fazer a manutenção da sua ajuda assistiva, o que é essencial para que a pessoa com deficiência exerça seu direito de independência e consiga desenvolver sua função laboral. A categoria conta com 17.417 pessoas com deficiência. São 4% do total de trabalhadores; 56% com deficiência física, 10% auditiva e 2% com deficiência intelectual. São 44% de mulheres e 56% de homens; 37% estão nos bancos públicos e 63% em bancos privados.
Na CCT assinada em 2024, com validade até 2026, novas conquistas para o público feminino no combate ao assédio sexual, moral e à violência doméstica. E, ainda, as mulheres conquistaram o direito à requalificação para uma área eminentemente masculina, como a da tecnologia da informação. “Garantir que mulheres tenham acesso a oportunidades em TI não é apenas uma questão de justiça social, mas também de inovação e competitividade”, destaca a presidenta Neiva. “Isso é valorizar a diversidade que gera melhores soluções e amplia a capacidade de resposta às transformações tecnológicas, beneficiando a sociedade como um todo.”
A CCT também determina a igualdade salarial entre homens e mulheres que atuam em funções equivalentes. Igualdade atualmente também garantida por lei que começou a ser debatida, na década de 1990, no Sindicato e nos encontros de mulheres do movimento sindical da CUT.
Consciência negra
Entre os empregados dos bancos públicos e privados, 113,8 mil trabalhadores se autodeclararam negros ou negras. O correspondente a 26,2% do total. Elas são 50,8 mil ou 12% do total. Os homens e mulheres negros estão subrepresentados em toda a categoria bancária, enquanto são 55,5% da população.
Durante o VIII Fórum Nacional pela Visibilidade Negra no Sistema Financeiro, realizado em Fortaleza (CE) nos dias 6 e 7 de novembro de 2025, mês da Consciência Negra, esses e outros números da Relação Anual de Informações Sociais (a Rais, do governo federal), elaborados pelo Dieese, demonstraram disparidades absurdas. A remuneração média das mulheres pretas no setor bancário é 37,7% inferior à remuneração média do bancário branco do sexo masculino. A sub-representação de pessoas negras nos cargos de liderança está no centro desse problema. Do total de 65.945 cargos de chefia, 15.934 são ocupados por negros (pretos e pardos), 24% do total. E mesmo nos cargos de liderança, as mulheres pretas ganham 50,3% do que ganham os homens brancos. E as mulheres pardas 51,1%.
“Todos os anos cobramos isso da Fenaban: temos muito para avançar na participação dos negros no mercado de trabalho bancário, com planos de cargos e salários justos que alterem o racismo que está na estrutura da sociedade brasileira e dos bancos também”, critica Neiva.
Quarto Censo
Entre setembro e outubro de 2025, os bancários responderam ao 4º Censo da Diversidade. Conduzido pelo Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (Ceert), o estudo abrangeu cerca de 405 mil trabalhadores, além de 5 mil estagiários e aprendizes de 35 bancos, o que representa 93% da força de trabalho do setor, segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados do Ministério do Trabalh, o Caged.
A divulgação do resultado do 4º Censo está prevista para fevereiro de 2026. Para mais informações ou dúvidas, acesse: censo.diversidade.org.br .
“A realização desses Censos é fundamental para a categoria bancária. Por isso frisamos sempre a importância da participação de todos os trabalhadores e todas as trabalhadoras. Esse conhecimento de quem somos, ajuda a escolhermos caminhos para trilharmos o melhor, rumo ao que podemos e queremos ser”, completa a presidenta do Sindicato, Neiva Ribeiro.